Entre reflexões sobre as origens da celebração e estratégias de marcas contemporâneas, mergulhe nas diferentes faces do espírito natalino para entender o que esperamos do Noel.
Pode até parecer uma lenda popular, mas não é. A Coca-Cola ajudou sim, de certo modo, a moldar a imagem do Natal que “consumimos” atualmente, mais especificamente do Papai Noel. Guirlanda, árvore de Natal, presentes, pisca-pisca, dourado, vermelho e verde entre outros elementos invadem o mês de dezembro trazendo junto aquela sensação transcendental de, “É o fim ou recomeço?”. Seja como for, no mundo globalizado, cheio de informação que ninguém mais acredita em Papai Noel e sim nas marcas, não tá fácil nem para Coca-Cola vender o tão sonhado espírito natalino. Assim, a pergunta que fica, peguei bode do Noel?
Mas, antes de explorarmos a transformação desse sentimento, moldado em parte pela publicidade, é importante perceber que a Coca-Cola apenas explorou e ressignificou uma antiga celebração dos nossos ancestrais.
Tudo por comida
Ainda não se trata da comilança da ceia de Natal, mas sim um momento de fôlego para o calendário agrícola dos nórdicos. Dia 22 de dezembro é o solstício de inverno no hemisfério norte e marca o dia mais curto para região. A partir daí, a terra volta a se movimentar a favor do Sol no movimento de translação, responsável pelas estações do ano, trazendo dias mais longos, com mais sol e mais alimentos. Tudo que nossos ancestrais, pequenos agricultores, precisavam, segundo entrevista do historiador Pedro Paulo Funari, professor de história e arqueologia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) para o portal de notícias, Terra.
Segundo Funari, a comemoração do nascimento de Jesus Cristo só aconteceu quando no século IV o cristianismo ascendeu socialmente em Roma, que também comemorava o Deus Sol Invictus. Daí em diante, os religiosos se apropriaram da comemoração pagã e ressignificam como símbolo cristão.
O cristianismo se apropriou, inclusive, da imagem do papai noel, que era originalmente um dos deuses nórdicos, Odin. Já os presentes, o historiador defende que foi um processo mais natural. O ato de trocar presentes é uma forma de reforçar laços sociais, ainda que o capitalismo tenha encorpado o movimento.
Uma das marcas responsáveis por lançar a figura do bom velhinho da forma que conhecemos hoje, rodando o mundo com um saco recheado de presentes, foi a Coca-Cola. Segundo o próprio site da empresa, em 1931, o ilustrador Haddon Sundblom foi encarregado de criar imagens publicitárias de um Noel saudável e simbólico. Deste então, essa interpretação calorosa e humana é responsável por invadir nossas casas com o espírito natalino, prometendo união, amor, celebração e presentes.
Doendes, Elfos e Gnomos natalinos: quem são e como se comportam os consumidores no natal?
Segundo reportagem do Valor Econômico, mais de 60% dos supermercadistas projetam um aumento nas vendas para o período, fazendo do Natal a data comemorativa do ano com o maior volume de vendas para o comércio.
Para as marcas, representantes do espírito natalino, é fundamental a participação de nós, consumidores. Os verdadeiros gnomos, elfos e doendes, trolls que vão às ruas buscar os melhores presentes para seus queridos, ajudando a pulverizar a mensagem natalina e a fazer a roda econômica girar. A Diretora de vídeo e vendas do Google, Emily Hotz, compartilhou algumas dicas para otimizar a jornada de compra desses consumidores impactados por anúncios do Youtube e ávidos por fazer parte do clima natalino. Para ela, existem quatro tipos de consumidores que se comportam de forma diferente nesta época do ano. Entendê-los, possibilita às marcas a traçar uma linha do tempo entre julho e dezembro para alinhar as estratégias conforme o canal e a estratégia de comunicação mais indicada.
- Os Deliberados
Esse é o tipo de comprador que começa a se planejar ainda no meio do ano, pesquisando preços etc. Neste período, eles estão na fase de planejamento, considerando cuidadosamente suas compras de Natal e criando listas de desejos para o Noel. - Os Pechincheiros
Durante essa fase, os consumidores estão ativamente em busca de ofertas. Esses compradores passam o mês de outubro e novembro buscando produtos que priorizem tanto a qualidade quanto o valor em suas compras de Natal.
- Os Determinados
Há quem ache que as compras de Natal são uma experiência social e precisam ser feitas no natal. Então, à medida que as festas se aproximam, os compradores tornam-se determinados a concluir suas compras. Eles utilizam todos os dias e recursos disponíveis para finalizar as aquisições antes da temporada festiva.
- Os Devotos
Após o período de pico, alguns compradores entram em uma mentalidade devota, continuando a fazer compras mesmo após a temporada de festas.
Natal: a maratona de compras do Noel começa no Youtube
Hoje em dia é quase impossível realizar uma compra sem antes ver um vídeo no Youtube . Segundo estudo da Google/TalkShoppe (2022), 85% das pessoas que utilizaram o Youtube na jornada de compras afirmam que adquiriram o produto e 93% desses afirmaram manter suas compras, sendo que a taxa média de devolução no varejo é de 16,4%.
Segundo Emily Hotz a plataforma tem essa relevância, pois reflete o comportamento de compradores que buscam inspiração e confiança. Por isso, Emily recomenda como estratégia, que as marcas considerem manter ativa a linha do tempo de conteúdo ao longo do ano e em datas especiais e lançamentos utilizar conteúdos inspiracional, gerando conexão com os consumidores.
Fazendo a magia acontecer!
Antes de criar qualquer ação, marcas precisam considerar algumas estratégias para criar campanhas que representem tamanha expectativa em torno da data. Já que a comemoração fortalece laços humanos muito antes de se tornar uma data comercial, fazer com que as ações atravessem gerações, caso da Coca-Cola, por exemplo, parece ser o norte a ser seguido.
Essas campanhas que moldam nosso imaginário desde a infância, seguem alguns pontos destacados por Stephen Lepitak, editor de marketing do portal ADWEEK. Confira:
1. Eventos culturais consistentes e nostálgicos
Invista em campanhas que se tornem eventos culturais, transcendendo os anúncios de TV. Para isso, aposte em jingles e ações multicanais comprometidas a reforçar a mesma identidade visual durante os anos. Crie um storytelling para seu arquétipo brilhar enquanto carrega sua mensagem, incorporando elementos de nostalgia nas campanhas.
- Coca-Cola
Já é esperado que a propaganda da marca toque corações e seja destaque nessa época, afinal, eles criaram o papai Noel. Seus anúncios continuam a ser destacados por sua “simplicidade” e consistência ao longo dos anos, contribuindo para a longevidade e ressonância cultural. Nesse ano, a marca resolveu dar protagonismo ao bom velhinho e em um mundo de papais-noéis mostrou que o sentimento que rege é a compreensão. Apesar de simples, a mensagem toca justamente pela honestidade ao abordar um tema comum e necessário.https://www.youtube.com/watch?v=znIyaGS5BNc
2. Construção de consciência da marca
Expor os consumidores repetidamente ao mesmo anúncio pode aumentar a conscientização da marca. Investir numa forma única para contar a sua visão sobre a data, também. A familiaridade gerada pelo storytelling, criado a partir dos valores da marca e por repetições, criar uma conexão mais profunda com os espectadores. Isso contribuí para uma campanha mais eficaz.
- Apple
Disrruptiva, como a Apple gosta de ser, o storytelling da campanha pretende conversar com aqueles que não se encaixam nos comerciais de natais convencionais, cheios de entes queridos por perto. Para conversar com os solitários, a Apple também evoca reflexões de quão complexos podem ser as relações e ações humanas. Por fim, a marca investe fortemente nas redes sociais para garantir que todos os usuários tenham acesso a sua campanha.
3. Refrescar Conceitos
O mundo está em constante transformação, por isso, não tenha medo de transformar suas campanhas, caso faça sentido. Pequenas modificações ou adições criativas relacionadas a tendências modernas, como levantar bandeiras sociais, pode manter o interesse e a relevância ao longo do tempo. Esse é o caso do Boticário, Ikea e Peta. (tem que ver se dá para incluir os 3 exemplos na quantidade de laminas)
- Boticário
Muito atual e necessária, a campanha do Boticário fala sobre intimidade artificial. A história chama atenção para quando menosprezamos oportunidades de estar presentes com aqueles que amamos e somos capturados pela dopamina da tela do celular. Com uma narrativa sensível à maioria das famílias modernas, é impossível não se emocionar.
https://www.youtube.com/watch?v=NXgMSP38-1
- Peta
A maior organização de direitos dos animais investiu em uma campanha de Natal contando a história do Peru. A narrativa é inspiradora e saí da separação de mãe a filho para um plot twist de uma mesa de Natal vegana para esperar a chegada do Noel.
- IKEA
A Ikea também investiu em uma abordagem não tão romântica sobre o maior feriado do ano, lembrando que para muitos esse é um momento sobrecarregado de trabalho dobrado. Assim, nada melhor do que um momento de descanso acompanhado por um móvel IKEA.
4. Experiência do consumidor e plataformas digitais
Crie campanhas que vão além da publicidade tradicional, proporcionando uma experiência positiva para o consumidor. Como falamos acima, a diversidade de formatos do YouTube é eficaz para envolver os consumidores, já que ele pode perceber o produto de diversos olhares na jornada de compra. Para as campanhas natalinas, pense em adaptar as estratégias de comunicação para cada canal de forma específica.
- Seven Eleven
A loja de conveniência dos EUA aproveitou a ocasião para reforçar sua marca de roupas própria. Enraizada no imaginário popular americano como aquele estabelecimento “para todas as horas”, a campanha de natal exalta os pijamas natalinos, roupa típica da comemoração da família americana.
- Leia também: Como surfar nas trends sem se afogar
E o espírito natalino vai prevalecer?
Dado que a história do bom velhinho é bem mais antiga do que o sistema capitalista, é possível dizer que o natal também pode ir além de uma maratona de compras. Os sentimentos de gratidão, amor e alegria que reforçam nossos laços entre a comunidade são o fio condutor da celebração desde o início e são eles que sustentam todo o resto.
Ainda que marcas se esforcem para alavancar seus produtos, algumas das campanhas que trouxemos mostram que novas reflexões precisam acompanhar a comemoração. O mundo está se transformando e nunca ficou tão evidente que boas narrativas, branding e marketing precisam caminhar juntos e Papai Noel nos ensina o quanto uma marca pode, sim, impactar tendências sociais.
A Coca-cola reinventou a figura do Papai Noel em 1931. Assim, cabe a nós observarmos e escolher qual marca vai nos fazer acreditar no bom velhinho novamente.
Beijos da Be.